quinta-feira, 10 de setembro de 2009

"Words are little bombs."

Na hora H as palavras não vêm. Nadam ao redor, cardumes inteiros de épicos e cânones, sutras e proibidões, em movimentos arritmicos, não permitindo paz a mentes em blur. Imitam monstros e deuses, rezando para você deixá-los em paz, até que sintam uma fome tão antiga quanto mitoses em sopas primordiais. Mergulham, então, dentes ranhidos, olhos injetados, cavando, impacientes e inconsequentes, túneis até uma superfície de espelho e fogo doado, onde se misturarão com a multidão, primeiro passando desapercebidos, depois ganhando notoriedade instantânea, em uma simbiose de cartel. Somos isso, esse amontoado de zeros e uns metafísicos, bits indigentes em uma nação de yottabites, uma corredeira de nós mesmos, destruídos e criados no mesmo instante, um círculo terrível e fascinante, onde tudo é déjà vu e nada é blasé.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Bardo Thodol

Quando você perder todos os nomes como uma cobra desliza para fora de sua antiga pele, beija-flores incandescentes decolarão em padrões de vôo instantâneos e fáceis de esquecer. Irão atrás de flores e sexo, e se contentarão com cometas que acendem núcleos férteis de luas frias onde farão seus ninhos entre galhos em espirais de bosques de hélice-dupla, aguardando sonolentos no centro de tudo, pequenos deuses que são, estilhaços de amor e embalo. Aguardando as Monções.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Flux

Você consegue sentir todas essas mortes? O cheiro de carniça e placenta, trocando turnos, entrelaçando-se, elípticos, fundindo-se como zigotos perfeitos, tomados de paixão furiosa a ponto de explodirem em sangue e luz, parindo o próximo e único instante, mortalmente ferido. Você consegue ver algo assim? Você, a consequência de todas as coisas mortas e inatingíveis que em um dia de ficção já pisaram neste mesmo chão, e a causa de todos os momentos-siameses que, ainda no ninho, mastigarão uns aos outros até que reste apenas um, você. Seus atos, querosenes em lampiões, jogam luz na neblina, iluminando de forma difusa e cegante o próximo passo-parto. E, cada vez mais sábio, você sabe menos, faz pior, acumula bagagem, histórias, dna, passado, momentum. E no borrão do seu discernimento, você sacrifica sua própria divindade por um contexto fácil, um claustro onde ri e chora com a benção de um porquê. Deixe disso, seu amontoado de cabecinhas ocas. Olhe para o céu à noite e entenda que você não tem absolutamente nenhuma relevância diante de todas aquelas galáxias. Mas, por outro lado, é a única coisa que confere a elas algum significado. Seu presente para o universo. É belíssimo, obrigado.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Epifanias que não levam a nada 3 (Pocket Edition)

A verdade é um bisturi abrindo sua carne e mostrando a você o dia bonito que está fazendo lá fora.

domingo, 31 de maio de 2009

Roda Gigante

Estou por conta. Os canais todos ligados, metade deles, estática e fantasmas. Babel voltaica marretando bifes úmidos. Tribos de memes canibais lutando por supremacia em labirintos de areia movediça. Manchas de terra e sangue em ladrilhos no Olimpo. E então, você entende que é um espelho de frente para outro, refletindo reflexos ad eternum. Metáforas são, como esta, chaves para portas e celas, e você nunca sabe se vai sair por uma ou entrar em outra. E lá está você, eu, todo mundo junto e misturado, Brahma entretido em seu jogo, acenando na esquina, quase um borrão contra a luz de uma tarde cinzenta e dourada de água, bruma e pedra fosca. Um blue movie infantil onde júbilo é lar. Logo na esquina. Não fossem os sons dos carros e dos pássaros, o cheiro do lixo e de sexo, as cores, pixels e ângulos, o roçar dos elétrons, o flerte gravitacional, o gosto da saudade e do raio na sua espinha, você entenderia o que digo. E eu.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

"Making some sense...when there's no sense at all."

Para onde ir agora? Os pulmões funcionam como bússolas ao mostrarem timidez e dúvida. Por vezes sou um poço onde as dores param para beber e depois seguem viagem. Boa viagem. Sinto necessidade de uma forquilha rápido. Logo aparecem guias com suas frases feitas e lanternas made in Bodhi Gaia, e com eles não irei. Como seguir alguém nesse mundo? Como fazer uma coisa dessas, quando o próprio caminho se desdobra diante dos olhos e das unhas, passivos e insondáveis como os olhos dela naquela noite, e kármicos, simplesmente kármicos? Sem guia dessa vez. Talvez a única, talvez na próxima. É hora de voltar a deixar as meias em cima da TV e parar de se observar. Esse botão de foda-se não deve estar funcionando direito, vamos dar uma risada e abrir essa escotilha. O vento lá fora se esfrega em concreto, água salgada e motor, e é só vento. E eu, a sós com sextilhões de estrelas, uma relação desigual, onde minha ignorância é um par de brincos com o qual todas elas se arvoram e se fazem belas. E juntos ardemos em nossa suíte de matéria escura, torcendo lençóis de linguagem e transpirando sinapses, perdendo a própria noção de onde começa um e termina o outro, lembrando: não há nada a perder. Em breve nos despediremos, e deitarei água, watts e merda em mais um dia que começa como qualquer outro: perfeito e átono. E com um sorriso. Agora.

Id-trip

A voz dela, como Danette em minha língua, me empurra para dentro de mim, mas não há luz para mostrar o terreno. A areia movediça que me engole é negra como um céu de tornado e os uivos do vento parecem tão velozes que é um milagre entender que sou eu quem passa por eles, cristais e pedras-pome de vidas engarrafadas em ampulhetas. Sou um meteorito e deixo meu rastro de bobagem carbonizada na atmosfera da noite. Quem me vê faz um pedido, mas não posso dar esmolas cósmicas e não conheço truques de vapor e luz. Sinto compaixão por quem, como tantos eus, depende de um sorriso para sorrir. Aqui não há chão , nem tampouco o que olhar. Apenas bagagem e navalha. Ouço meninas de pijama e monstros padecendo da fome causadas pela seca que eu criei em meu coração-umbigo. Sei cada vez menos até, fatalmente, ser cada vez mais. Ponto da história em que química é música e segundos são apenas um primeiro e único.
Aí eu acordo e dou uma mijada.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Posologia: ler

Não comece. Nem tente. Você não vai chegar a lugar algum. Esqueça. Você não é nada. Ninguém. Nem pense. Tudo o que você fez até hoje é lama, merda e carniça. Tudo o que fizer vai virar piada. A única coisa verdadeira em você rejeita o seu próprio nome como se ele fosse lepra. Nenhuma das suas carências vai ser saciada. Nenhuma das suas vontades, atendidas. Você que se foda. Vai sentir fome, frio e vontade de foder debaixo do viaduto na chuva e vai ficar por isso mesmo. Enquanto você insistir em se comportar como um mendigo mimado, não tem conversa.
Ou você pode parar com essa merda e se dar conta das dezessete horas, nove minutos e dezesseis segundos.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

De: pulôver velho

Sinto-me um esquizofrênico ao fazer isso. Mas, já que basta uma única interface para que seja tudo uma imensa mentira, então não importa. Não existe garantia alguma de que iremos nos encontrar, mas existe sempre um quem sabe que arranha o crânio como um homem inocente arranha as paredes da masmorra. E caso seus olhos cheguem a este punhado de fótons embebidos em zeros e uns, saiba disto: você foi amado(a) durante muitos anos. Amou muito e muitas vezes. Ouviu canções que poderiam secar óleos de ódio em engrenagens de morte e dor. Perdeu jóias de valor incalculável, mas soube se contentar com o tempo em que as teve nos dedos. Acima de tudo, quis a verdade, mesmo sabendo que ela não se incomodaria em matar o eu em você. Conselhos são vidas em pen-drives, e eis o meu para você: não deixe a blusa que veste agora fazer você de chinelo. Sua personalidade é nada mais que a sombra dos detritos de sensações que orbitam uma estrela que, ao invés de Hidrogênio em Hélio, funde amor e entendimento em Você. Tudo o que você tem a fazer é deixar queimar.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Rollercoaster

Isto não foi planejado. Sem teorias. Sem ensaios. Apenas a porra do momento presente se fazendo onipresente, esticando seus braços para todas as direções jamais vislumbradas antes, o ponto de fuga encurralado e a coerência com a cueca levantada até o pescoço. "Bom" e "Mau" são loucuras que criamos junto com linhas retas e ampulhetas de Césio 133 e ansiedade. Esquecemos quem somos, não nos conhecemos mais. Olhos não são janelas, são espelhos. Cérebros são úteros e nós somos mães de todos os nomes. Somos uma corja de malfeitores charmosos, prontos para foder com o seu paradigma, como se ele cobrasse 5 pela chupeta atrás da lata de lixo. E vamos que vamos neste teste de Roscharch multicolorido e tridimensional chamado Samsara, Tellurian ou Cobal do Humaitá; o que estiver rolando no momento. A roda gira desde sempre. E você tem que se virar com o que acabou de dizer, cada olhar, gesto, exalação e canção atingindo todo o resto como a um cometa, causando destruição sem precedentes e trazendo vida, cores em telas de papel e luz. A raiva que você sente, o seu cheiro de suor, a sua difculdade em estar nas coisas mais bobas, os acordes que você implora para calarem todo o resto, todas essas coisas estão aí e sempre estiveram, mas você nunca as viu. Você nunca existiu antes desse exato instante, e apesar disto, você se lembra. Lembrar é pegar emprestado a juros exorbitantes: sua própria história. E os agiotas logo quebram suas pernas como somente os melhores anjos da guarda são capazes de fazer. Você e eu, somos eventos breves demais para qualquer um ter certeza de que existimos de fato, não podemos vacilar. Precisamos transformar nosso chumbo em ouro. Precisamos de fama. Precisamos ficar. Precisamos virar o jogo. Precisamos de velhos milagres, que ofusquem quasares e transformem nossa fome em pães, peixes e sorrisos. Precisamos de um Gran Finale. Precisamos começar.

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Anônimo

Ele deixou rolar. Chamou na xinxa pragas de memórias-gafanhoto e tempestades de sobras de arranca-rabos, quebra-paus e pensamentos de elevador. Encarou lap dances das mais safadas colegas de escola e todos os boquetes de banheiro nas noitadas da vida. Deixou a onda arrebentar, sendo empurrado rente a arrecifes de amenidades tão afiadas quanto a voz de um oncologista em plena segunda feira. Quantas vezes ele já havia estado ali, vestindo quantos rostos? Sentia o ar rarefeito e a garganta, como um wormhole. Quando esqueceu seu nome, viu o Abismo. Parou na beira e foi então que sentiu como era antigo, vasto e profundo o pavor de tudo o que havia experimentado até então, coisas que faziam dele quem era e que imploravam, prometiam, negavam, odiavam e perguntavam "por quê?".
Pulou, e então, nada.
E só então, tudo.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Medo velho

E depois, o quê? Enquanto reza ou injeta, você observa a dúvida como se ela fosse uma bússola cujo pólo norte é um Triângulo de Bermudas quântico, onde possibilidades colidem e naufragam, escarrando na cara de homens-maçã ao ocupar o mesmo lugar no espaço entre duas orelhas sujas de cera e mel de abelhas cachorras e safadas: tu gosta que eu sei. Carne deseja carne, seja para comer, seja para foder, mas acima de tudo, para não apodrecer; inútil tentativa, pois o destino de todo homem é ser cadáver, nuvem, chuva, menina, fogo e rebimboca da parafuseta em uma engenhoca cósmica capaz de olhar para si mesma em noites de céu malhado e auroras de um pavor viscoso e dizer "caralho!", quase sempre sem se tocar que não admira galáxias e quarks, cordilheiras e milagres, e sim ombros e cílios, dentes e unhas. Olhos que fitam diamantes terríveis e perfeitos, mas enxergam apenas instantes. Não seja bobo: instantes não existem, apenas diamantes.
Você não se lembra?

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Showdown à beira do abismo

As paredes do meu último abrigo chacoalham forte enquanto a tempestade lá fora mói amigos e estrelas. O vento que ruge também sussurra estilhaços, olhares de escárnio e grandes finais para romances de rodoviária. Se você prestar atenção, pode até entender como o pretérito se tornou imperfeito e planejar um futuro melhor, 2.0, sua realidade vó, sempre disposta a passar a mão em sua cabeça e acordar você com um copo de Nescau. O vento marreta as paredes enquanto sopra a história de uma vida de instantes desonestos, metronomos, jamais parando no único lugar real, onde as forças gravitacionais de ódio/amor e apego/medo não podem afogar cérebros em marés altas, território exclusivo de répteis que matam ou escapam. E só.
Confiro os ferrolhos da porta, certo de que irão segurar a tormenta e me manter livre do vórtice, mas a esperança, um anão obeso e vestido como um palhaço, mas que ri como se eu fosse ainda mais ridículo, é o calcanhar de aquiles de meu refúgio, abrindo frestas por onde entra o som, o cheiro e o pó do vento, transformando espectativa em desejo de aniquilação, indo direto no nervo, trincando dentes e espelhos, me fazendo desejar coisas horríveis e vergonhosas, tolices com as quais eu não deveria me demorar. Mas ouvir a voz do vento é saber de muitas coisas, é quebrar a obra de arte perfeita em infinitos cacos para depois batizá-los. É trocar os olhos de quem ama você por um rival montado com memórias e sonhos, um espantalho sob um céu sem corvos.
Não quero mais brincar disso. Melhor destrancar logo essa porta e deixar o vento arrebentar com tudo. É hora de entoar o mantra mais sagrado, e com vontade: Foda-se.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Epifanias que não levam à nada (2)

No princípio, não havia o Verbo, apenas interjeições distraídas de si. Eis que [Linguagem] coloniza [Homem], sem saber o significado de seu ato. [Homem] nada sabe de significados, apenas age. Não são opostos, são metades. São ímãs, ying e yang, Romeu e Julieta, Hitler e Churchill. Juntos, saciam fomes que imaginam possuir, e emulando virais asiáticos, vomitam um na boca do outro livros e pontes, acenos e estrofes, deuses e funerais, profecias e logotipos. Paradigmas erguem-se das profundezas de um oceano cinzento e eletroquímico para depois afundarem como Atlântidas menos metafóricas do que supomos. Nossos nomes são âncoras que nos impedem de, à deriva, cruzar a fronteira de um nevoeiro de signos, enquanto lentamente nos arrastam para fossas abissais, onde escafandros são pálpebras de láudano, úteros que nos privam de nosso próprio parto. Somos uma espécie cômica, ao menos no que toca nos crermos uma espécie, fato portador de uma ironia única e uma verdade ambígua, o único tipo possível. Somos homens e mulheres, colônias de bactérias, impérios de fungos, escombros de cometas e saloons de guaninas vadias. Somos cadeias de carbono e de supermercados, onde putas e larvas empurram seus carrinhos em direção ao caixa, que reluzem nebulosos e vermelhos, certos do retorno de clientes insatisfeitos porque sempre têm razão. Não encontrará aqui respostas para este dilema, nem para outro qualquer: apenas palavras, açúcar para seus olhos. Almas gêmeas de egos pernetas. Moedas tiradas de sua orelha. O que diabos você quiser.